sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O melhor vai começar

O Natal passou, vem aí o Reveillon que me parece, sim, bem pior. Até porque é naquela hora em que o ano vira, em que os fogos estouram no céu, que eu tenho certeza de que mais sentirei falta do beijo e do abraço de amor que a gente sempre se dava. Sentirei falta da convicção do sentimento, da perenidade, dos planos e sonhos que juntos reafirmávamos na noite do dia 31 de dezembro. 
 
Apesar dessa saudade que vai estar lá, revirando o porão de dentro de mim, eu sei que eu vou estar feliz por ver 2010 acabando enfim. Racionalmente, eu sei que é só um marco cronológico, um dia para outro, nada demais, nada muda... Mas é que aqui dentro eu sinto que posso ter esperança de que 2011 seja muito, muito melhor. Sinto, como eu disse uma vez, que o Ano Novo é como uma página de papel em branco, em que se pode escrever ou desenhar o que quiser.
 
E, cá pra nós, é tarefa bem fácil ser melhor que 2010. Nada de grandes expectativas, grandes projetos, ambições, nada de sonhos engatilhados... Perguntaram quais são meus planos para esse Ano Novo tão esperado e a resposta é nada. Já disse que nem sei o que fazer com o resto da vida que me espera. Não tem nada grandioso em perspectiva, nenhuma mudança na vida, nenhum emprego novo, nenhuma bolada esperando, nada. O que eu espero é um ano de quietude, tranquilidade e paz. Eu quero um ano doce, leve, e, por isso mesmo, feliz. 
 
Não é pedir muito. Não é dever de trigonometria. Não é uma equação mirabolante. Basta mesmo passar mansinho e me permitir de novo a sensação de que as coisas voltaram aos seus lugares. Por fim, venho pensando muito nessa música e que ela fique como prenúncio de que o melhor vai começar.


"Eu quero o sol ao despertar
brincando com a brisa
por entre as plantas da varanda
em nossa casa


Eu quero amar
É lógico que o mundo não me odeia
Hoje eu sou mais romântico
que a lua cheia


Você mostrou pra mim
onde encontrar assim
mais de um milhão de motivos pra sonhar
E é tão gostoso ter
os pés no chão e ver
que o melhor da vida vai começar"


http://www.youtube.com/watch?v=4Q1gHKUDaxo&feature=player_embedded#!

PS: Esse blog encerra o ano com uma média de mais de 8.000 acessos por mês. Eu sei que descubro a cada dia dezenas de leitores anônimos, que torcem e me acompanham em silêncio, quero agradecer o carinho e a força que vocês me mandam mesmo sem que eu saiba. Aos leitores oficiais, seguidores, aos que se dizem fãs, meu muito obrigada também. Vocês são como família pra mim! Feliz Ano Novo a todos!

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Deve ser por isso

Há essa bagunça dentro de mim. Uma confusão de sentimentos que ora explode, ora se afunda, ora derrama, ora seca. Há coisas que eu deixo escondido embaixo do tapete do porão de dentro, porque nem eu mesma me sinto preparada para lidar com elas. Ficam lá, intocadas, esquecidas, a gente finge que não se vê, a gente finge que não se sabe. E assim, eu vivo a minha vida mais inteira, mais em pé. Preciso confessar também que eu não sei lidar muito bem com a dor, nem a física (limiar bem estreito) nem a emocional. Eu não sei lidar, eu não sei o que fazer, então eu fujo. Fujo do que faz doer, fujo do que faz tudo revirar. Às vezes, é óbvio, a dor é mais rápida que a minha carreira e a enxaqueca me derruba, o turbilhão de dentro me faz dobrar os joelhos. Mas o meu impulso quando me deparo com as dores inevitáveis da vida é correr delas. Não é uma atitude racional, é instintiva. É apenas questão de sobrevivência. Deve ser por isso que eu procuro levar a vida olhando pra frente, pra depois. Deve ser por isso que eu passo pelas coisas pisando firme, para andar por sobre elas e deixa-lás para trás. Deve ser por isso, nem eu sei, que tem gente que me chama de rocha, de fria, de guerreira... Deve ser por isso.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

PS: I love you

Fazia tempo que eu queria assistir de novo ao filme "PS: I love you". Fazia tempo que ele tava lá na prateleira me esperando e eu deixando para depois para não passar de novo pelo turbilhão. Eu imaginava como seria rever aquela história, dessa vez, me colocando no lugar da personagem principal e recebendo aquelas cartas que me moveriam para frente no meio do luto. E, ao assistir ao filme, foi impossível não me reconhecer ali, em tudo, na vontade de que a vida terminasse, na falta de motivação, na preguiça até pra tomar banho, nas sensações da presença dele.... Eu chorei muito e, mais uma vez, meu vale de lágrimas serviu para aliviar a dor que não sai de mim, e, ao mesmo tempo, me faz andar para frente.

Seguem os trechos mais lindos do filme, em inglês (porque eu tenho essa mania de assistir aos filmes em inglês mesmo e sem legenda em português):

Holly: Do you think it'll be all right if I stop my life right here? Never leave my apartment till I'm old, sit in my wedding dress...
Friend: wich you never had.
Holly: ... with an old piece of wedding cake...
Friend: wich you never had... You gotta be rich to be insane, Hol. Losing your mind is not a luxury fot he middle class.
Holly: That's not fair!!!
Friend: It's not!


Holly: When daddy left, I was 14 and I said "that's it, never again, no man...". Then I meet Gerry... This wonderful man happens to me and then, and then he died. What's the point? I'm so angry I could kill somebody. I'm alone and it doesn't matter what job I have or what I do or what I don't do or what friends I have. I mean, you're alone no matter what...


And the last letter:
"Dear Holly,
(...) I have a feeling that this is the last letter because there's only one thing left to tell you. It isn't to go down memory lane or make you buy a lamp. You can take care of yourself without any help from me. It's to tell you how much you moved me, how you changed me. You made me a man by loving me, Holly, and for that I am eternally grateful. Literally.

If you can promise anything, promise that: whenever you're sad or unsure or you lose complete faith that you'll try to see yourself through my eyes. Thank you for the honor of being my wife. I'm a man with no regrets. How lucky am I? You made my life, Holly, but I'm just one chapter in yours. There'll be more... I promise.

So, here it comes, the big one. Don't be afraid to fall in love again. Watch out for that signal when life as you know it ends.

PS: I will always love you"

E eu chorei de novo escrevendo isso...

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Amigos

Na escola, eu fiz amigos que me acompanham na vida. Desde as baladas, nos carnavais, nos casamentos, nascimentos, batizados e viagens além mar! Eu tenho amigos da vida toda e não cabem nos dedos das mãos... Eu não sei como teria sido esse ano sem vocês.

Nesse fim de ano, eles alegraram meu coração. Nesse fim de semana, eles lotaram a minha casa e me fizeram esquecer minhas dores. No dia 25/12, turma TELF, sem combinação prévia, fiz ligações às 19h e a pergunta: "você topa?". E todo mundo respondeu: "tô indo!". No dia 26, a turma da 8ª série, no nosso encontro anual e já tradicional. O bolão que a Debbie inventou fez todos corações palpitarem e tornou a festa muito mais animada. Muito bom tê-los em minha vida! Amo vocês, meus amigos!


Galera TELF: Vinny, Eu, Rick, Roch, Falcones, Camilla e Gabriel

TELF ainda: eu, Paty Maionese, Amiga da Paty - Aline e Gabriel

TELF de novo: Lician, Camilla, Filipe - marido Camilla, Eu, Weslley e Stenio - marido Lician

Galera 8ª série: todo mundo na minha imensa sala (não vai dar pra nomear)

Susu, Debbie e eu

Ricos depois de dividir o bolão (Henrique - namorado da Debbie - e eu)

domingo, 26 de dezembro de 2010

Rindo com Matheus XVIII

Amigo secreto da família Alencar. Todo mundo sabe que eu acabei de me mudar para a casa nova. Aí ganhei um jogo de queijos muito lindo. Mostro para o Matheus bem empolgada.

-Meu amor, olha o que a mamãe ganhou: um jogo de queijo!
- Mãe, como é que joga esse jogo?!?!?!

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Então, é Natal

 4 meias na decoração da casa velha

Nós quatro - Reveillon 2009/2010

Então o Natal chegou e, muito embora haja luzinhas piscando na cidade toda, sinto meu coração apagado, perdido no breu, de preto, em luto ainda. Todo mundo diz que é porque essa é a primeira vez. Pode ser que seja só isso. Há uma dor que mora aqui hoje e, quando todo mundo celebra a família, a união, o amor (de Deus, eu sei); eu só sinto falta. O vazio me queima, a saudade me corrói e eu fico com aquela sensação de que falta muito ainda para ser feliz de novo.

Eu sempre fui uma pessoa muito Natalina. Sempre foi a minha data preferida no ano. Quando eu passei a ter uma casa pra chamar de minha, junto com ele, eu passei a adorar a preocupação com decoração, velas, guirlandas, árvores, meinhas... Lembro do nosso primeiro Natal, com o Matheus bebê, os dois suando em bicas nesse calor senegalês... Lembro do carinho dele para com a gente. Lembro da roupa que usamos. Lembro dos Natais seguintes também: em 2007, tudo que ele queria era que eu parasse o anticoncepcional para ter outro filho no ano seguinte, disse que era o presente que ele queria; em 2008, com o Thomás bebê, ele disse que não queria mais nada, só saúde e terminar a residência; em 2009, a gente vivia um momento de reconciliação e era felicidade grande com toda a perspectiva da festa de casamento.

E agora eu estou só, arrumando os pequenos, assando o Peru, arrumando a casa (nova, em que ele nunca esteve), preparando tudo para um Natal que parece meio sem sentido, meio sem razão, meio imaginário, como se a gente estivesse brincando sobre como seria se o pior acontecesse. O problema é que o que de pior poderia acontecer, efetivamente aconteceu. E, mesmo perdida, mesmo sem saber direito o que projetar para o futuro que me aguarda, mesmo sem entender ainda tudo que aconteceu, eu sinto que eu preciso fazer com que seja mágico para os pequenos.

É por eles que o Peru está no forno. É por eles que a gente vai vestir roupas novas e sorrir e cantar e fingir que não dói quando crateras estão sendo abertas por dentro. É por eles que eu ponho um sorriso no rosto e arrumo o cabelo e faço peregrinações nas casas dos parentes. É por eles e porque eu sei que seria assim que ele gostaria que eu fizesse.

Eu não sei se algum dia eu vou voltar a me empolgar com as luzinhas que piscam na cidade nessa época do ano, mas eu sei que eu vou continuar mostrando-as para os pequenos, porque o que me move é o brilho no olhar deles. E, o Matheus sempre diz que a estrela que mais brilha no céu é o pai dele, que seja, Thi, você brilhando e fazendo menos dolorido o nosso Natal.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Carta para o Papai Noel

Querido Papai Noel,

Tenho alguns considerações a fazer antes de pedir qualquer coisa.

Este ano foi de provas e testes e eu até que me saí bem deles. Não foi, com certeza, a melhor nota da turma, mas eu acho que deu para passar. Eu não sou mais a aluna do quadro de honra - pelo menos, não para estes tipos de avaliações, mas eu consegui fazer o meu melhor diante de tudo que me foi colocado à prova. Fui persistente, focada, determinada, tirei sangue dos meus próprios olhos, me dediquei ao máximo a tudo e fiz o impossível. Eu fui uma menina bem comportada, obediente e resiliente; fiz todos os deveres de casa e alguns serviços extraordinários; cumpri integralmente as tarefas que me foram passadas; e sobrevivi ao campo de guerra, acho que mereço um presente especial esse ano, não?

Então, Papai Noel, o que eu quero pedir nem vai pesar no seu saco, nem vai ser um fardo tão grande. Não preciso de bens materiais, nem de rios de dinheiro, nem de presentes caros e refinados, nem de viagens a lugares exuberantes, nem de restaurantes e hotéis cinco estrelas, nem de festas homéricas... Eu quero só que a vida não me apronte mais essas surpresas desagradáveis, que corra tranquila, serena e doce; que traga pessoas que acrescentem, que se juntem ao grupo, que se integrem; que seja simples e em paz. E é só disso que eu preciso. Se eu ganhar esse presente de Natal, prometo continuar sendo uma boa moça e não pedir coisas estapafúrdias em nenhum outro Natal.

Deixa agora a gente ser feliz, Papai Noel, porque o quinhão de sofrimento que cabia na vida toda, foi suportado em 2010.

Obrigada.

Marcele

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Cartas para você XXI

Thi,

Hoje foi a aula da saudade da sua turma da residência. E foi lindo ver o quanto você é querido, o quanto você marcou a vida de tanta gente. Foi realmente especial saber que não é só a gente, de dentro de casa, que sente o coração moído por essa sua partida precoce. Do diretor do hospital mental à auxiliar de limpeza, todo mundo veio falar com a gente sobre você.

Seu nome foi mencionado no discurso do orador, Davi, que ressaltou que a presença de todos seus familiares era sinal da sua presença ali. Seu nome está na placa, ainda que o in memoriam aperte o nosso peito. Você foi o primeiro nome a ser chamado pelo Diretor do Hospital para receber o diploma e, antes de me entregar, o ele fez questão de ressaltar a sua atuação lá, sua importância, sua competência... É incrível perceber que a característica que te define é o carinho para com tudo, mozinho. Você apareceu no vídeo com fotos, e as palavras eram todas de saudade.

Tenho certeza de que hoje seria um dia de felicidade e alívio para você. Tenho certeza de que estaríamos eu, seus pais, seus irmãos, sua cunhada e sua tia lá naquele auditório, papocando de orgulho de você. Tenho certeza de que seus amigos vão fazer tanto sucesso quanto eu sei que você faria. Ah Thi, eles foram tão delicados comigo. Entregaram-me uma rosa por estar presente.

Sabe, conter as lágrimas foi bem difícil... Em alguns momentos, eu não conseguia parar de tremer, o coração palpitando, um aperto que parecia torcer meu peito... Eu nem sei de onde vem a força que me impede de desabar, de chorar ali, alto, com soluços, como no dia um. Eu não sei como eu consegui ficar de pé e sorrir. De uma coisa eu sei: foi lindo estar lá, foi ótimo pensar em como seria se não, e foi maravilhoso perceber que absolutamente nada, nenhum aspecto da sua existência foi em vão. Nada em você era mais ou menos, Thi. NADA.

Senti muito sua falta hoje, falta de segurar sua mão, falta de encher o peito de orgulho por mais uma conquista que não deu tempo de você concluir. Eu sempre soube que não era só aquilo ali que determinava o psiquiatra que você era, mas o que batia dentro de você. Acho que foi isso que eles reconheceram ao entregar o certificado pra mim. Como eu disse em algum lugar: você era médico de almas, por isso, psiquiatra.

Muito orgulho ainda por aqui...
Ainda saudade. Ainda Amor.

Moreninha

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Em clima de Natal

Matheus e Thomás cantam Jingle Bells

Onze meses

O Anjo Mais Velho - Teatro Mágico
http://www.youtube.com/watch?v=dnga63bL0p4

Enquanto houver você do outro lado
Aqui do outro eu consigo me orientar
A cena repete, a cena se inverte
Enchendo a minh'alma d'aquilo que outrora eu
deixei de acreditar
Tua palavra, tua história
Tua verdade fazendo escola
E tua ausência fazendo silêncio em todo lugar
Metade de mim
Agora é assim
De um lado a poesia, o verbo, a saudade
Do outro a luta, a força e a coragem pra chegar no fim
E o fim é belo incerto...

depende de como você vê
O novo, o credo, a fé que você deposita em você e só
Só enquanto eu respirar
Vou me lembrar de você
Só enquanto eu respirar


E, num susto, o fim de ano chega; e, num susto, onze meses se passaram. Onze meses dessa ausência que faz silêncio em todo lugar. Onze meses e ainda dói. Tudo. Muito. Onze meses e eu ainda olho para foto dele, da formatura, vestido de médico, com o sorriso arrasador e pergunto: "Por que você teve de morrer, hein, Thi?"

Junto com esse ano infeliz que vai embora, vai se encerrando também o primeiro ciclo, o primeiro ano, o primeiro tudo sem ele. E, por mais que eu anteveja a carga pesada do janeiro trágico que faz aniversário; acredito que tudo vai ter a sensação de eu-já-passei-por-isso. Ainda dói demais, é fato. Ainda é inacreditável. Ainda me deixa mortificada por dentro. Matheus ainda me faz perguntas difíceis, onze meses depois. Ainda pergunta pelo pai e ainda tem muitas lembranças mesmo que 1/4 da vida dele tenha passado desde o acidente. De algum modo, o que nos resta é olhar para frente, é superar a dor e deixar crescer a sensação de que ele está lá do outro lado, ajudando a gente; e eu aqui, aos trancos e barrancos, segurando as pontas da lucidez.

Eu tenho um compromisso com o que ele foi, com o exemplo que ele é para os nosso filhos. Tenho um compromisso com a história dele. Eu sei que muitas coisas vão se perder no redemoinho da memória, mas eu não quero que os pequenos percam nem a imagem nem as histórias do pai. E é desse jeito que eu quero levar minha vida: parte com essa saudade, com os verbos conjugados no pretérito perfeito e no futuro do pretérito; outra parte com essa força que vem não sei de onde, com coragem, com esperança.

Eu não sei pra onde a gente vai nessa estrada tortuosa em que fomos jogados há onze meses. Eu não sei o que há no futuro e talvez seja essa incerteza que gere toda a magia. Eu só vou torcendo para que seja tudo melhor, tudo mais tranquilo e em paz. Que seja doce.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Migalhas

O que é difícil entender é que para quem falta tudo, qualquer coisa é muita coisa. Se não se tem nada; o que parece sobra, resto, pouco é muito, é ótimo, é tudo. Quando se está no deserto, na rua, sem teto, sem abrigo; qualquer sombra, qualquer pé de pau, qualquer barraco vira lar, qualquer jornal vira lençol, qualquer caixa de sapato vira travesseiro. E é muito fácil para aqueles que estão dentro das suas casas, com seus pratos de comidas, com suas roupas quentinhas, com todo seu conforto, achar absurdo que ali, naquela caixa de papelão, naquele beco, embaixo do viaduto, estejam toda a vida e todos os sonhos de uma pessoa. Mas é o que disse: quando não se tem nada, o pouco é muito.
 
A melhor característica do ser humano, a que nos tornou seres evoluídos e selecionados, é justamente a facilidade de adaptação. A gente se adapta, a gente se acostuma. É fácil se acostumar com o que a vida tem de bom, com luxo, com facilidades, com praticidades... Mas quando tudo, absolutamente tudo, é tomado; a capacidade de adaptação permanece e até impressiona. É triste, é pesado, é vazio, é difícil; mas a gente se acostuma e sobrevive com menos, com muito menos, com quase nada.
 
E volto a dizer: para quem tem quase nada, qualquer oferta é ganhar na loteria. Vem aquela sensação de que é preciso agradecer por isso, que pode ser a única oportunidade, a única refeição do dia, o único conforto, a única vez. Vem também a impressão de que é preciso desfrutar daquilo intensamente, cada colherada, cada pedacinho, cada vez, lenta e profundamente. Vem junto um desejo de que dure, de que seja eterno, de que a vida dê um pause. Vem um anseio para que não acabe, porque voltar para o nada é penoso demais.
 
Quem não tem quase nada se refestela com muito pouco e abre a guarda e se entrega aos pequenos momentos como se fossem únicos, porque eles bem podem ser. Quem não tem quase nada se acostuma com o pouco que tem e se deslumbra com qualquer coisa. Quem não tem quase nada se entrega muito mais facilmente; é ludibriado mais facilmente; é atropelado por tudo muito mais facilmente; perde mais facilmente; deixa escapar entre os dedos porque apertou com muita força e apertou com muita força porque queria reter o momento.
 
Nessa altura do campeonato, já deu para perceber que eu não estou falando dos flagelados, descamisados, moradores de rua, né? Vocifero com Cazuza: "Migalhas dormidas do teu pão... Raspas e restos me interessam. Pequenas porções de ilusão... Mentiras sinceras me interessam, ME INTERESSAM!"

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Sobre esperança

A Mirys (Diário dos 3 mosqueteiros) lançou a campanha para que todos refletissem sobre as coisas que não podem faltar, de jeito nenhum nas nossas vidas. E eu refleti, conversei com meus botões e descobri que imprescindível mesmo é ter ESPERANÇA.

Não importa por que tragédias, dores, perdas, incômodos e dissabores se passou. O que conta é manter um olhar de esperança em relação à vida. Acreditar que o melhor está no porvir. Acreditar que o futuro trará gratas surpresas. É isso que faz com que as pessoas sigam em frente, mesmo diante de um momento absurdamente infeliz. Muitas vezes, a esperança se perde dentro da gente, se esconde nos nossos recônditos, some diante da crueza dos dias difíceis, mas é preciso encontrar um jeito de retomá-la e colocá-la à frente de tudo, enxergar o mundo através dela.

É a esperança que permite que a gente acredite no impossível, em milagres, na felicidade plena. É a esperança que faz com que a gente sonhe, planeje, projete e torne realidade. É a esperança que dá aquela sensação de que tudo vai dar pé, de que "tudo vai se realizar no ano que vai nascer". É a esperança que faz com que as pessoas estudem, trabalhem, lutem, progridam. Ela muda os tons de cinza dos dias tristes e permite que vejamos apenas o colorido de um futuro brilhante.

A esperança faz cosquinhas no nosso coração partido, quebrado, sangrando. A esperança reanima os doentes, os que perderam tudo. A esperança faz a gente querer superar e ir em frente; faz a gente antever o futuro em que tudo estará bem e em paz. É ela que motiva, que agita, que vibra dentro de quem não tem mais opções. A esperança é um bichinho verde que mora dentro da gente e a única coisa que devemos fazer é permitir que ele viva. De alguma forma, ela dá um jeito da gente não se perder, não sufocar, não ser engolido pelos problemas e desafios que nos são impostos.

Não consegui pensar em nada mais imprescindível que a esperança; porque a gente vive temporariamente sem amor, sem família, sem paz, sem grandes desafios, sem quase tudo. Mas nem temporariamente a gente pode perder a esperança de que tudo, absolutamente tudo, vai dar certo.  

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Awfully low


"Some day, when I'm awfully low, 
When the world is cold, 
I will feel a glow just thinking of you... 
And the way you look tonight. 

Yes you're lovely, with your smile so warm 
And your cheeks so soft, 
There is nothing for me but to love you, 
And the way you look tonight. 

With each word your tenderness grows, 
Tearing my fear apart... 
And that laugh that wrinkles your nose, 
It touches my foolish heart. 

Lovely ... Never, ever change. 
Keep that breathless charm. 
Won't you please arrange it ? 
'Cause I love you ... Just the way you look tonight. "


Eu sempre cantava essa música para ele nas inúmeras festas de casamento a que fomos juntos. Era um sorriso muito envolvente e constante que ele tinha. Era muito carinho para com o mundo naquele olhar. Adorava vê-lo produzido no terninho (ele odiava e pedia pra tirar a cada 5 minutos). 

Tem uma história engraçada de um casamento a que fomos juntos, de uma amiga dele da escola... Nesse dia, ele não quis de jeito nenhum colocar o terno. Usou uma blusa manga curta xadrez com uma calça social e só. Era fim de ano, faz muito calor nessa época. Quem o conheceu, sabe que ele pingava, escorria, derretia de suor. Mas eu achava um absurdo ele não usar o terno! Encontramos outros amigos na festa. E tiramos uma foto no celular com a comadre Dea só para mandar para o compadre Trabalhoso que tinha ficado em Sampa. Aí a gente recebe uma mensagem do compadre: "O trabalhoso aí pensou que era uma festa junina?". 

Era assim que eles se amavam, se xingando sempre. Um chamava ao outro de trabalhoso. Um tinha têmporas gordas, dedos de salsicha, sudorese excessiva; o outro era pouca telha, barriga de pochete... E eu tenho saudade das nossas saídas, das nossas conversas, dele não querer atender as ligações do trabalhoso bêbado de madrugada e eu insistir pra que ele atendesse, porque poderia ser algo importante. Quando ele desligava, sempre dizia: "viu? era só cachaça!"; e eu dizia: "viu? ele é seu amigo! podia lembrar de um monte de gente e lembrou de você!".

Fim de ano sem ele não é a mesma coisa. Alguém que também sofre essa dor da ausência me disse: "Antes eu esperava ansiosamente para que o Natal chegasse; e agora eu só quero que passe logo!". Digo o mesmo. Passa logo tudo isso. Passa logo e bem rápido. Eu não quero ficar remoendo esse vazio que o dezembro me esfrega na cara. 

Nesses dias em que eu estou awfully low and the world is cold, I feel a glow just thinking of you and the way you always looked at me...

This time will pass

Muitas vezes, as músicas dizem muito mais do que eu mesma poderia dizer. Essa, então, é certeira e tô com ela na cabeça já tem tempo. Enjoy yourselves!

"I'm not afraid of anything in this world
There's nothing you can throw at me that I haven't already heard
I'm just trying to find a decent melody
A song that I can sing in my own company

I never thought you were a fool
But darling, look at you
You gotta stand up straight, carry your own weight
These tears are going nowhere, baby

You've got to get yourself together
You've got stuck in a moment and now you can't get out of it
Don't say that later will be better now you're stuck in a moment
And you can't get out of it


I will not forsake the colours that you bring
But the nights you filled with fireworks
They left you with nothing
I am still enchanted by the light you brought to me
I still listen through your ears, and through your eyes I can see

And you are such a fool
To worry like you do
I know it's tough, and you can never get enough
Of what you don't really need now... my oh my

You've got to get yourself together
You've got stuck in a moment and now you can't get out of it
Oh love look at you now
You've got yourself stuck in a moment and now you can't get out of it

I was unconscious, half asleep
The water is warm till you discover how deep...
I wasn't jumping... for me it was a fall
It's a long way down to nothing at all

You've got to get yourself together
You've got stuck in a moment and now you can't get out of it
Don't say that later will be better now
You're stuck in a moment and you can't get out of it

And if the night runs over
And if the day won't last
And if our way should falter
Along the stony pass

And if the night runs over
And if the day won't last
And if your way should falter
Along the stony pass
It's just a moment
This time will pass"

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Lamentando

Nessa vida louca que a gente leva, eu pude observar algumas coisas sobre as relações e sobre os laços que formamos. A gente pode até conviver com todo tipo de gente, mas só se aproxima de pessoas semelhantes, só cria laços com parecidos. Quanto maior a quantidade de características e interesses e assuntos em comum, maior também será o grau de amizade e afeto.

Algumas relações duram anos, mas depois de acabado o vínculo único que se tinha, elas simplesmente desaparecem. É muito provavelmente isso que aconteceu com aquele seu melhor amigo do curso de inglês da adolescência, ou com aquele colega do trabalho anterior. Você não deixa de gostar daquela pessoa, mas ela só fazia parte da sua vida por um único motivo e, quando o motivo não existe mais, nada resta da relação que se tinha.

De fato, é muito difícil acumular alguns melhores amigos ao longo da vida. Porque para estes há interesses em comum que se modificam ao longo do tempo, que vão acompanhando sua trajetória. Você muda, a pessoa também muda e continua ao seu lado. A maior parte das pessoas não conta os amigos verdadeiros que tem em uma única mão (eu tive mais sorte). Mesmo assim, mesmo sabendo que tenho muitos amigos por aqui e por aí, não consigo deixar de sofrer quando vejo alguém que entrou na minha vida com ares de longevidade se afastando deliberadamente.

Admito que perder dói, ainda mais quando a convivência era assídua e parte da rotina. Admito que gostaria de reter, prender aqui e impedir o que eu vejo acontecer. Mas eu já vi esse filme antes, em que eu gritava "nós éramos amigos!" e ouvia "mas isso foi em outra época"; e eu dizia "mas eu continuo sendo" e ouvi "eu também, só que de um jeito diferente!". E como eu já sei o final da história, nem arranco meus cabelos por isso. Mas eu lamento. Só lamento.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Conselho

Ela me contou baixinho e em segredo que não conseguia entender porque sentia aquilo tudo quando se tratava dele. Sabia que queria correr para longe dessa história, que era caótico demais, que era pesado, e sabia que não era fácil lidar com tanta coisa. Ao mesmo tempo, ela se sentia tão ligada a ele, tão próxima, tão companheira. Sentia que só ela era capaz de entender o que ele sentia, que só ela perceberia aquilo tudo que ele guardava dentro de si e mais ninguém. Ela queria tanto ter ele mais perto, ser dele, viver com ele que esquecia até de si mesma, das limitações, dos problemas que tinha que resolver dentro de si também. Ela confundiu tudo com ele, se projetou nele, esperou por ele e fez esse amor surgir como uma missão, como uma tarefa, como que salvação, como final feliz.

Ah, minha amiga, não sei porque a gente tem mania de achar que será capaz de mudar o que não muda; de salvar o que já foi destruído; de fazer diferença quando já nem importa mais... Não sei porque a gente acredita nesse amor-fênix! Não sei porque a gente insiste em bater na porta se não tem ninguém para abri-la para gente. Não adianta nada eu dizer para você desistir, porque a gente não tem poder nenhum sobre o coração. Mas reconhecer a derrota também é atitude dos bravos e valentes. Quando tudo que podia ser feito foi feito, o que resta é não fazer mais nada, já disse a Clarice.

domingo, 12 de dezembro de 2010

O que a gente tem feito

Último dia de aula 1

Último dia de aula 2

Comemoração de Natal CJN

Best dançarinos ever

Meus pequenos 

Família CJN

Amigas desde o berço e até o berço...

Todo mundo esperando a Zuzu

Curtindo a casa nova 1

Curtindo a casa nova 2

Curtindo a casa nova 3

Curtindo a casa nova 4

sábado, 11 de dezembro de 2010

Ah, Clarice...

Corro perigo
Como toda pessoa que vive
E a única coisa que me espera
É exatamente o inesperado



(Clarice Lispector)

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Sobre o luto

METADE

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.


Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada

Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.


Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece

e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas

Como a única coisa que resta a um homem
inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.


Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso

mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste,
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.


Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.


Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.


E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
(Oswaldo Montenegro)

Ser derrubada pelo vendaval de se perder quem se ama, gera uma série de sentimentos contraditórios e intensos na gente. Sem dúvida nenhuma, no meu processamento da dor, o medo foi o principal deles, o mais presente, o mais constante. Medo de não conseguir fazer tudo sozinha, de não dar conta, de não conseguir criar meus filhos, de não conseguir manter um padrão mínimo razoável de vida, de não encontrar mais ninguém, de ficar sozinha para sempre, de deprimir... Medo de carro, de trânsito, de tráfego, de estrada... Medo de morrer e deixar meus filhos órfãos, medo da burocracia, das contas, das dívidas... Medo, medo, medo. E, no meio do caos, foi preciso redescobrir aquilo que eu buscava, os meus próprios valores, o meu caminho. A morte de parte do que eu tinha, não só do meu amor, mas também de grande parte da minha vida, dos meus sonhos, dos meus projetos, dos meus planos, do meu futuro; não me fez calar. Pelo contrário, me fez falar e escrever, escrever, escrever... Mas grande parte do que me dói agora dói em silêncio, só de vezenquando essa dor dá seus gritos.

Ainda sou capaz de ouvir a música da minha vida tocando e, embora tenha sido este um momento, um ano inteiro, muito triste, eu consegui dançar no ritmo que me foi imposto. Esse amor que me acompanhou, me transformou, me tornou o que eu sou não pode simplesmente deixar de existir. Ele persiste amando o meu Thi, ainda que ele não esteja mais aqui. Porque a gente não se acostuma nunca com a partida nem com a saudade. E o amor que nos uniu transcende a matéria. É um amor pelo que ele é. E o que ele é ainda existe em mim e nos pequenos.

A pessoa que me tornei depois disso não é nada além, não é mártir, não é perfeita, nem mais forte, nem mais guerreira que ninguém. A pessoa que me tornei depois disso tudo é apenas o cômputo final de perdas e ganhos, partidas e descobertas. A pessoa que me tornei depois de tudo isso é apenas o que dá pra ser. Não sou modelo, exemplo, paradigma. Nada do que eu faço e sou serve para mais alguém, que não eu mesma. E é preciso respeitar minhas decisões e atitudes, porque eu me agarrro àquilo que me resta e conheço minhas limitações. Antes de cada decisão, muitas vezes eu escuto os outros; muitas vezes eu decido no instinto e em silêncio.

Em alguns momentos, sumir, desaparecer e morrer pareceram-me boas opções. A vontade de ir embora daqui, do olho do furacão, reverberou em mim de maneira estrondosa. E, vezenquando, dá ainda o ar da graça. Que essa ansiedade, essa tensão, esse medo do mundo, essa sensação de perdida e de vazio sejam recompensadas com um futuro na calma e na paz que eu mereço. Porque não é certo viver para sempre em bipolaridade. Não quero, depois de tanto fundo no poço, uma vida de elocubrações e explosões, de racionalidade e de lágrimas. Eu quero paz e sorrisos, nada mais, nada menos.

É inevitável o medo de ficar sozinho, de não dividir com mais ninguém, de não ter companhia na vida. E conviver consigo mesmo depois de tanto tempo como casal é realmente uma experiência dolorosa. É preciso recuperar a auto-estima. É preciso reconhecer que a felicidade está dentro de si. É preciso enxergar o mundo ao redor, a vida e as pessoas com olhos de esperança e manter o coração aberto como quando se é criança, sem estampar as cicatrizes para que eles não sejam magoadas. Não se deve esquecer o que se foi, o que se perdeu, nem todas as lembranças. Viver o luto é como reabilitação de viciado. Um dia de cada vez. Baby steps. Não saber o que sobrou depois que metade de si foi arrancada é, sim, perfeitamente normal.

E como viciado em recuperação, é preciso reconhecer e desfrutar das pequenas alegrias que surjem no meio do pior pesadelo que se tornou real. Amigos verdadeiros, risadinhas de bebês, viagens inesquecíveis, uma cosquinha no coração... E que esses pequenos alentos aquietem a alma e afugentem a amargura. É preciso segurar firme neles para emergir do afogamento. Só eles devolvem um pouco do fôlego para continuar remando. A memória da força e da segurança de quando éramos mais de um serve de abrigo para aqueles que restaram e sobrevivem na ausência, na falta e na dor. E que o cansaço, inevitável, seja superado a cada novo amanhecer.

Não há nada que dê uma resposta aceitável, plausível. Nem arte nem religião. Nem ciência nem fé. Nem experiência nem desígnio. Não há nada que faça a sensação de revolta, de que puxaram seu tapete, de que o mundo está de cabeça pra baixo, sair de dentro. Mas não procurar respostas e motivos é a maneira mais fácil de lidar com isso. É só seguir a despeito de tudo. E fazer tudo algumas vezes como expectador de si mesmo, como se fosse a história de uma outra pessoa, com o distanciamento de quem assiste; em outras, como artista, como ator, como cantor do próprio destino.

E se, em alguns momentos a sanidade, a coerência, a razoabilidade e o equilíbrio sumirem, que haja perdão, porque tudo que nos resta, depois de encarar a morte de frente, é o amor por aquela pessoa que não mais está.

* Este texto me surgiu depois da leitura do blog "As perdas e o luto", cuja autora publicou essa música do Oswaldo Montenegro ontem e disse que achava que parecia a descrição da viuvez.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Keep walking

"Eu me sinto às vezes tão frágil, queria me debruçar em alguém, em alguma coisa. Alguma segurança. Invento estorinhas para mim mesmo, o tempo todo, me conformo, me dou força. Mas a sensação de estar sozinho não me larga. Algumas paranóias, mas nada de grave. O que incomoda é esta fragilidade, essa aceitação, esse contentar-se com quase nada. Estou todo sensível, as coisas me comovem." (Caio F.)
Viver não tem sido fácil. Há que se lutar com um leão por dia. Há cálculos mentais para adequar sonhos e projetos com orçamento familiar limitado. Há saudade e vazio. Há enxurrada de lembranças e de memórias vezenquando. Na maior parte das vezes em que elas me atacam, eu corro, corro, corro. Vou para bem longe para que elas não me assolem. Em algumas vezes, elas me pegam, me desmontam, me jogam no chão do fundo do poço de novo. Eu fico lá chorosa, no escuro, juntando meus pedaços... Mas subo as escadas rapidinho, porque eu as construí bem sólidas, resistentes, para cair e voltar aqui para cima quantas vezes for preciso.
Mesmo aqui em cima, não é tudo céu azul. Tenho minhas tempestades e erupções. Tenho meus anseios e frustrações. Tenho a vida como ela é: nem sempre certa, nem sempre justa, nem sempre coerente. Apenas a vida. E que alternativa eu tenho a não ser viver? enfrentar esses problemas todos? desfrutar das coisas boas (que sejam em maior número, por favor!)? Desistir de tudo não é opção. Sigo meu caminho árido, cheio de buracos, sem manutenção e sem cuidado; mas sei que esse é apenas um trecho do percurso.
Há de ter logo mais à frente céu azul e bela vista, cheiro de comida caseira, beijo de amor, mãos dadas e corações enlaçados. Há de ter logo ali, depois daquela curva (ou seria um looping?), pré-adolescentes sem traumas, carinhosos, confiantes, esforçados e estudiosos. Há de ter, mais na frente, segurança, equilíbrio e paz. É só continuar na marcha, ir tocando em frente... O percurso pode até ser difícil, mas é preciso manter o coração tranquilo. E eu vou cantando que "ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais".

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A dor de agora

É claro que a dor que dói agora não é mais daquelas de enlouquecer, de perder o chão, de fazer com que o mundo perca a cor... A dor que dói agora é quase sempre suportável, silenciosa, incômoda. A dor que dói agora não me prostra, não me acama, não me derruba no chão. Vezenquando, ela vem assim avalanche, dilúvio, cataclisma. Mas, na maior parte dos momentos, ela é discreta, perene, serena. É uma dor que fica lá, mas não me vira ao avesso. É uma dor atropelada por tantos outros problemas cotidianos: filhos, casa, compras, contas. A dor de agora é uma dor amiga, companheira, fiel escudeira. E eu sei que nem sempre falo sobre ela, porque meus momentos de escrita-exorcismo acontecem invariavelmente quando o vulcão explode lá dentro de mim.

A dor que dói em mim agora se torna imperceptível, inaudível, invisível, e anestesia, quando o cavalo branco se aproxima da janela e doces palavras dançam nas telas. A dor de agora me escapole entre os dedos quando confrontada pela presença constante e pelo cuidado todo. A dor de agora se resigna a ser lembrança quando a vida abre portas e janelas e estende tapetes na espera. A dor de agora se esquece de si e, altruísta, cede espaço e vãos para sorrisos, para conversas infinitas, para coincidências que assustam, para transmissões de pensamento. A dor que me acompanha baixa a cabeça e dobra seus joelhos perante a perspectiva de felicidade. A dor de agora é sublimada ante esse bem querer designado, em que o que é externado é parcela ínfima do sentimento.

A dor que me acompanha não se foi, não sumiu, não saiu da minha vida nem de mim, mas ela me permite umas tréguas, uns hiatos, uns afastamentos providenciais quando o bem que faz tão bem me cerca. E eu sigo minha vida neste surto bipolar: às vezes, cataclisma; às vezes, anestesia. E espero pelo dia em que ela seja só silêncio e resignação.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Para Debbie






Eu não vou dizer que a gente se conheceu há dezoito anos porque, se eu disser isso, todo mundo vai pensar que a gente é balzaca e a gente não é - ainda! - e "tamo" aí na luta, com cremes e produtinhos primorosos cuja finalidade é retardar a ação dos fatores oxidantes da pele. Eu vou dizer que a gente viveu aventuras incríveis na adolescência, como levar uma amiga na primeira vez num ônibus urbano, como colocar um amigo de turma com uma rosa na boca dentro de uma caixa de presente, como fazer uma faixa enorme para torcer pela nossa representante de turma na disputa pela Rainha da escola, como promover uma gincana... Assim, todo mundo vai saber que a gente se conhece desde a mais tenra idade... Eu vou dizer que, muito embora não fôssemos as melhores amigas na época da escola, a gente sempre foi da mesma panela, a gente acompanhou o desenrolar da vida uma da outra. A gente viu caras entrarem e saírem das nossas vidas. A gente viu a vitória do vestibular e da formatura. Ela me viu casar e me tornar mãe e eu acompanhei a ânsia de conhecer o mundo que tomou conta dela. A gente viu e torceu e vibrou com cada conquista, com cada decisão, com cada coisa que fez a gente se tornar o que é.

Não sei como e também não sei desde quando, ela se tornou uma das minhas melhores amigas. E ela foi uma das primeiras a saber das minhas gravidezes. Foi pra ela que eu contei quando um elefante branco estacionou na minha sala. Foi ela que ouviu grande parte dos meus desabafos chorosos. Foi ela que virou presença constante na minha casa, fosse pra bater papo, fosse pra dividir uma pizza, fosse só pra assistir ao capítulo final de uma novela... Ela vem me ouvindo diariamente, dividindo pesos, sonhos, contas, favores e a vida que a gente leva, desse jeito meio louco, meio torto, meio árido e difícil às vezes. Foi ela que me disse da morte dele antes mesmo que eu soubesse e eu neguei. Foi pra ela que eu confidenciei o quanto ficaria sozinha sem ele, ainda debruçada sobre o caixão. Ela esteve presente em todo meu janeiro trágico, no meu fevereiro catatônico, no meu março despedaçado, no meu abril despertando, no meu maio reveillon, no meu junho de sonhos, no julho viajando... Ela esteve presente quando agosto se fez um gosto e no setembro de chá de casa nova. Ela veio no apê novo antes de todo mundo e me deu força e achou lindo e me fez confiante de novo. Foi ela que passou mal comigo quando o novembro se fez trágico. E é pra ela que dezembro se abre como essa despedida de tudo de ruim que eu poderia viver.

Eu não tenho palavras para definir a amizade que eu devoto a ela, porque, para mim, ela já é uma parte muito grande do que eu sou. Eu espero corresponder à altura tudo que ela representa. Da mesma forma, não quero nunca ter de ser pra ela o que ela foi pra mim neste 2010 de provações. Sei que não há mais como separar o que esses dezoito anos promoveram na gente, você pode até ir para as terras estrangeiras, mas não vai deixar de ser a minha Debbie de todos os dias, nem a Tia Bebe dos meus pequenos. No dia em que você comemora mais um ano, minha amiga, eu só poderia te dar aquilo que eu sei, aquilo que eu sinto, aquilo que há aqui dentro, porque depois de tudo que vivi, eu descobri que o melhor presente de todos é a presença na vida. Estou aqui com e para você sempre!

Te amo, Debbie! Feliz Aniversário!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A dor de novo em fotos

A maior dor que eu tive na vida foi a dor de perder meu marido. Até então, eu não tivera sofrimento algum. Alguns dissabores, alguns incômodos, alguns momentos tristes, sim, como todo mundo. Mas sofrimento mesmo, assim pesado, assim de virar a vida de cabeça pra baixo; nunca, nenhum! Eu realmente não sei como sobrevivi e como consegui chegar até aqui. Ontem, sem querer querendo, eu encontrei fotos do dia do acidente, fotos dele sendo atendido, desarcodado, ainda dentro do carro, com um monte de gente ao redor. Fotos dele MORTO, machucado, com manchas de sangue na camisa, na calça, na testa. Fotos do socorro, dos carros, dele na ambulância...
 
Eu olhei rapidamente porque era tortura demais ficar analisando detalhes e, admito, meu estômago já revirava quando fechei a janela. Eu olhei porque eu não fui lá no dia do acidente, eu voltei pra casa, eu não queria ver. Eu olhei sem querer, mas achando que eu era forte suficiente para aguentar o tranco agora que quase 11 meses haviam passado. Eu olhei e me despedaçei tudo de novo, como no dia um, como no janeiro trágico, com a mesma revolta, me perguntando "por quê?", vendo ele ali e sem querer ver, sem querer acreditar. Eu chorei muito, convulsivamente, sentindo essa dor de novo. Pode ser porque é dezembro, pode ser porque eu tenha me tornado essa pessoa sensível e carente; e pode ser também que eu nunca me acostume com essa ideia, de que ele não existe mais. É que a gente não se acostuma mesmo, só vai sendo atropelada pela vida, pela burocracia, por novas pessoas e outras tantas coisas a fazer e aquilo tudo que dói, que pesa, que causa sofrimento vai ficando escondido no porão do de dentro. O fato é que ser assolada por aquelas imagens me fez ficar em frangalhos de novo. 
 
Não, eu não sei como eu cheguei até aqui... Eu também não sei se conseguirei superar isso tudo algum dia. Superar para que não doa mais, superar para que nada mais me faça voltar essa sensação de dia um, de dor visceral, de revirar o estômago. Eu espero que sim, que eu chegue nesse ponto. Mas enquanto isso, eu preciso muito agora de distrações e de piadas bestas, de amigos e de conversa mole, para seguir com a vida e para manter essa esperança de que a felicidade está tocando a campainha.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Pra você!


"Quero ver você não chorar, não olhar pra trás nem se arrepender do que faz. Quero ver o amor nascer, mas, SE A DOR CRESCER, VOCÊ RESISTIR E SORRIR. Se você pode ser assim, tão enorme assim, eu vou crer que o Natal existe, que ninguém é triste, que no mundo há sempre amor. Bom Natal. Um feliz Natal! Muito amor e paz pra você. PRA VO-CÊ!"

Porque ele adorava quando eu cantava essa música e desafinava no último verso. Porque a gente amava o espírito natalino. Porque era sempre uma delícia enfeitar a casa inteira com ele elogiando meus toques. Porque a gente queria fazer, a cada ano, um Natal mágico para os pequenos. Porque será o primeiro Natal sem ele e o único, triste em toda minha vida. Porque se eu resistir e sorrir, eu também vou crer que o Natal existe, que ninguém pode ser triste, porque é uma questão de escolha, como eu disse no post passado. Muito amor e paz pra você, Thi, onde estiver... PRA VO-CÊ!

sábado, 4 de dezembro de 2010

Escolhendo

A gente pode enfrentar um leão por dia. Pode comer o pão que o diabo amassou. A gente pode perder o chão, levar uma rasteira, uma topada de levantar a unha do dedão. A gente pode dormir todos os dias banhado em lágrimas e com a sensação de que tem uma estaca presa no coração. A gente pode sentir desfalecer diante de tantas notícias ruins. Pode querer dormir e esperar só o tempo passar até chegar ao final de tudo. A gente pode reclamar do mundo, da brutalidade, da crueza dos dias, da aridez das relações, da falta de tudo. Pode reclamar do vizinho que estaciona mal, do engarrafamento que piora a cada dia, da falta de planejamento público, do descaso dos governantes. A gente pode chorar a dor de perder quem se amava demais, a dor de ver alguém muito querido muito doente, a dor de não ser reconhecido, a dor de não ser amado em reciprocidade, a dor de traições e de indiferença, a dor pela dor do filho. A gente pode se deparar diariamente com muitos e infinitos motivos para fundo do poço. Se se quiser mesmo, a gente pode perder o brilho, o ânimo e a alegria por estar aqui. Se se procurar bem, a gente encontra razões para ficar lá embaixo mesmo, no escuro, sem saída, encurralados pelas dores todas.

Mas a verdade é que a gente também pode escolher o que priorizar, em que se concentrar e o que relevar. E assim todos os dias é possível escolher sorrir de si mesmo quando levar uma topada; dormir lembrando de momentos que, de tão bons, fizeram faltar ar; sonhar com alguém que faz o coração bater descompassado; rir lembrando da gargalhada impagável daquele neném mais gostosurento; ver sonhos e projetos mais próximos de serem concretizados e se sentir realizado por isso... A gente pode dar um abraço bem apertado em alguém que só precisa mesmo disso; pode deixar as lágrimas correrem por causa daquelas lindas flores com um cartão que vale mais que mil gestos; a gente pode sair pra dançar com amigos e perceber que nunca se está velho demais para isso; pode sair para beber e ter a melhor noite de conversa da vida; pode simplesmente segurar a mão de alguém em silêncio e dar todo conforto que é necessário. A gente pode aproveitar uma tarde inteira só brincando com os pequenos e descobrir que a gente é muito mais cuidado por eles que cuida deles. Pode viajar para lugares que nunca visitou e se apaixonar por lá e pode voltar para os lugares por que se apaixonou antes. A gente pode encontrar todos os dias pequenas coisas mínimas que fazem valer a pena. E, sabe, é isso que impulsiona a gente para enfrentar todos os leões e motoristas loucos e o trânsito caótico e as notícias trágicas do Jornal Nacional.

Se eu posso escolher, eu escolho viver e ser feliz. Todo dia.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Dúvidas

O que se faz se, quando a gente precisa desabafar, quando precisa de um ombro, quando precisa apenas do silêncio acompanhado, quando precisa de carinho e dengo, quando precisa de mãos entrelaçadas, quanda precisa de ouvido e camisas reservas, só se encontra o vazio? O que é que a gente faz se já tentou todas as explicações possíveis, já sondou inúmeros porquês, já perdeu noites em claro revirando pensamentos e lembranças, já esperou a conformação surgir, já esperou a revolta sumir e ainda assim não aquietou o coração? O que é que a gente faz se, mesmo encontrando saídas e caminhos e motivos e até compensações, mesmo encontrando outras pessoas, novas pessoas, antigas pessoas, ainda é só uma que faz falta? O que é que a gente faz se tudo que se queria era estar perto, mesmo que não fosse possível tocar, mesmo que não fosse possível falar, mesmo que fosse só os olhares se encontrando? O que é que se faz se há um desejo infundado e que, à essa altura do campeonato gostaria que tivesse desaparecido, de ter de novo entre os braços? O que é que se faz com esse vazio, com essa ausência, com esse não?

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Incorrigível

Quem não queria poder falar isso?

"E eu tenho vontade se segurar seu rosto e ordenar que você seja esperto e jamais me perca e seja feliz. E que entenda que temos tudo o que duas pessoas precisam para ser feliz: a gente dá muitas risadas juntos. A gente admira o outro desde o dedinho do pé até onde cada um chegou sozinho. A gente acha que o mundo está maluco e sonha com sonos jamais despertados antes do meio-dia. A gente tem certeza de que nenhum perfume do mundo é melhor do que a nuca do outro no final do dia. A gente se reconheceu de longa data quando se viu pela primeira vez na vida." (Tati Bernadi)

"... eu não te defino nem te compreendo, apenas sei que chegaste..." (Caio F.)

"Se não for hoje, um dia será. Algumas coisas, por mais impossíveis e malucas que pareçam, a gente sabe, bem no fundo, que foram feitas para um dia dar certo" (Caio F.)

"Se você ama, diga que ama. A gente pode sentir que é amado, mas sempre gosta de ouvir e ouvir e ouvir. É música de qualidade. Tão melodiosa, que muitas vezes, mesmo sem conseguir externar, sentimos uma vontade imensa de pedir: diz de novo? Dizer não dói, não arranca pedaço, requer poucas palavras e pode caber no intervalo entre uma inspiração e outra, sem brecha para se encontrar esconderijo na justificativa de falta de tempo. Sim, dizer, em alguns casos, pode exigir entendimentos prévios com o orgulho, com a bobagem do só-digo-se-o-outro-disser, com a coragem de dissolver uma camada e outra dessas defesas que a gente cria ao longo do caminho e quando percebe mais parecem uma muralha. Essas coisas que, no fim das contas, só servem para nos afastar da vida. De nós mesmos. Do amor. Se você ama, diga que ama. Diga o seu conforto por saber que aquela vida e a sua vida se olham amorosamente e têm um lugar de encontro. Diga a sua gratidão. O seu contentamento. A festa que acontece em você toda vez que lembra que o outro existe." (ana Jácomo)



quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Dezembro

Seja bem vindo, Dezembro, e, por favor, vá embora rápido. Se preciso for, colocarei vassouras atrás da porta, farei mandingas expulsatórias, pedirei reforço policial para mandá-lo embora. Seja bem vindo, Dezembro, mas tenha pressa em passar... Não precisa se demorar. Traga aquelas sensação boa de paz, deixe a solidariedade tocar os corações, mas não precisa me lembrar das faltas e dos buracos que foram plantados dentro de mim. Ai, Dezembro, eu sempre aguardei ansiosamente a sua chegada. Eu sempre adorei o clima que o acompanhava, mas é que agora eu mal consigo me manter sobre meus pés. Então corre, Dezembro, para a porta de saída. Não precisa se esticar com preguiça nem permanecer acalentando corações. Sua chegada traz recordações que eu nem quero ter e faz bater aqui dentro, mais pesado que tudo, a saudade do que não existe mais. Vai, Dezembro, vai rapidinho lá para a curva do caminho em que o que passou fica para trás e tudo que há à frente é um mistério a ser desvendado, com fumaça de felicidade e suspiros de boas novas.